Episódio 7 - Transcrição

No primeiro episódio desse documentário, lá na introdução, eu disse que a torcida athleticana já pediu para o Petraglia ficar no clube, depois pediu para ele ir embora e depois pediu para ele voltar.

Claro que eu estava generalizando. A torcida não é uma coisa só. A unanimidade não existe nem dentro das organizadas, quanto menos numa massa de pessoas que têm em comum, basicamente, o time do coração.

Mas o Athletico teve, sim, três movimentos de torcida que se conectam entre si.

Em 2002: Fica Petraglia
Em 2005: Fora Petraglia
E em 2011: Volta Petraglia

Os slogans das campanhas são muito parecidos, e não é à toa. Por trás deles está a mesma pessoa, e eu não estou falando de Mario Celso Petraglia.

(Doático Santos) Eu sou Doático Santos, presidente do PMDB de Curitiba. Estou aqui para pedir a sua atenção aos candidatos a vereador do nosso partido. Eles serão a voz ativa da população na Câmara Municipal. Sou também candidato a vereador e peço o seu voto…

Você sabe que existem pessoas que odeiam o Petraglia, principalmente entre aquelas que participaram da política interna do clube. Essas pessoas talvez odeiem, ainda mais, Doático Santos.

Eu não tenho nada pessoal contra ele. Pelo contrário. Conheci o Doático no começo de 2023 e ele foi um dos primeiros a conversar comigo para o documentário. Ele me atendeu mais de uma vez, sempre muito cordial.

Doático tem 66 anos, uma barba grisalha e, por conta de alguns problemas de saúde, ele fala baixinho e usa uma bengala para caminhar. Mas quem conhece Doático Santos a mais tempo não compra a imagem de um senhorzinho pacato. Ele foi um grande agitador político, dentro e fora do Athletico, e incomodou muita gente – inclusive o Petraglia, por algum tempo.

É a história desse torcedor que vai ajudar a contar a última parte deste podcast.

Eu sou Filipe Andretta e você está ouvindo o “Senhor da Razão?”, um documentário não autorizado sobre Mario Celso Petraglia e o Athletico Paranaense.

Vinheta de abertura

Episódio 7: Fica, Fora, Volta

Quando Doático Santos era adolescente, um piá, ele fazia parte de um grupo de amigos que se encontrava diariamente na Baixada, entre os anos 1960 e 1970, para ver jogos ou treinos abertos do Athletico. Inspirados pela Gaviões da Fiel, torcida corinthiana fundada em 1969, eles criaram em 1972 o ETA (Esquadrão da Torcida Athleticana), que consideram ser a primeira organizada do Furacão.

O nome ETA, claro, é uma referência ao movimento nacionalista basco que, na época, era uma temida organização paramilitar.

(Carlos Maranhão) Mas o que eu acho interessante é que as músicas que o ETA cantava eram músicas extremamente violentas…

Essa voz é de Carlos Maranhão e a gente estava numa confraternização do ETA em que eu fui como convidado.

(Carlos Maranhão) Olhe, vou citar uma pra vocês, a música era assim: ‘sai pra lá cafona, vê se me abandona, boco-moco, boco-moco, o Coritiba é um arranca-toco. Olha que coisa violenta (RISOS) Coisa incrível, né?

A torcida ETA existe até hoje, mais pacífica do que nunca, só que com status de “torcida virtual”. Um grupo de WhatsApp que reúne centenas de athleticanos.

Em 2001, quando o time do técnico Geninho começa a embalar no Brasileirão, o ETA faz uma ação ousada: eles colocam na frente da Baixada uma contagem regressiva para o título brasileiro. Aqui, mais uma vez, Doático Santos:

(Doático Santos) O Athletico começou a ter alguns lampejos e nós começamos a nos empolgar. Olha, nós vamos ser campeões do Brasil. ‘Ah, mas não tem como…’ Vamos ser campeão do Brasil. E, olha, daqui a três meses, nós seremos campeões do Brasil. Daqui a dois meses nós seremos campeões do Brasil. Até que terminamos a contagem, dia após dia, ‘faltam 30 dias para que a gente seja campeão brasileiro’. 

Faltando um mês para a final, a contagem regressiva ficou mais animada. O ETA passou a abrir um barril de chope todo dia, patrocinado por algum bar no entorno da Arena.

É claro que muito torcedor criticou a iniciativa, porque podia “zicar” o sonhado título. Mas, naquela vez, deu tudo certo.

(Delisiée Teixeira) O rosto athleticano é só alegria: Papai noel chegou mais cedo, desfilou rubro-negro e trouxe com ele a estrelinha amarela.
(Torcedor) Muito obrigado, Papai Noel! Valeu, Papai Noel!
(Delisiée Teixeira) E que presente de natal. Só esse ano foram dois títulos: o de bicampeão paranaense e, agora, o de campeão brasileiro – o primeiro do século.

Enquanto a torcida ainda comemorava o título de 2001 e o Natal, os bastidores do clube já pegavam fogo.

Petraglia ocupava o cargo de coordenador de marketing, mas era publicamente reconhecido como a grande liderança do Athletico. Foi ele quem deu a maioria das entrevistas pós-título, o que irritou alguns membros da diretoria.

Mas, além desse duelo de vaidades, tinha um conflito de planejamento.

Uma parte dos conselheiros achava que era hora de tirar o escorpião do bolso e investir pesado no futebol – gastar dinheiro com contratações e salários maiores para aproveitar o embalo, em busca de novos títulos.

Já Mario Celso Petraglia preferia a prudência. Ele defendia que o Athletico não estava pronto para gastar como um clube de primeiro escalão. E esse impasse vira um problema antes mesmo do réveillon, quando a diretoria precisa decidir se renova ou não o contrato de parte do elenco e da comissão técnica – todos muito valorizados pelo título brasileiro.

(Delisiée Teixeira) Na manhã seguinte, de novo ao aeroporto. Alex Mineiro, o herói das finais, viajou para descansar com a família em Belo Horizonte. Com a certeza da volta? O atacante está negociando a venda do passe que pertence ao Cruzeiro.
(Alex Mineiro) O passe está estipulado em US$ 2 milhões, só depende do Athletico para que nós possamos permanecer aqui no clube.
(Repórter) A sua vontade?
(Alex Mineiro) Permanecer.

Esse áudio é de uma reportagem do Globoesporte na véspera de Natal. E, nesse ponto da matéria, a imagem corta para Mario Celso Petraglia. Ele está de costas para a câmera, de frente para um enorme computador branco e parece estar inserindo dados numa planilha.

(Delisiée Teixeira) O futuro começa a ser planejado. O atual campeão brasileiro tem, já no primeiro semestre, duas competições importantes: a Taça Libertadores e o Torneio Sul-Minas.
(Petraglia) O plano que se fez foi dar a base e a infraestrutura e as condições para que o Athletico permaneça grande.
(Delisiée Teixeira) Realidade de campeão. Responsabilidade de satisfazer uma torcida que deseja muito mais.
(Torcedor) É o começo. Essa é a primeira das cinco que a gente vai ter!

Só que o planejamento de 2002 foi ruim – muito por causa dos desacordos internos.

O ano já começa mal. O Athletico pega um grupo relativamente tranquilo na Libertadores (com América de Cali, Bolívar e Olmedo), mas fez uma campanha horrível. No final de março, já estava eliminado, em último lugar, com apenas uma vitória em seis jogos.

Durante essa Libertadores, na noite de 4 de março, Petraglia surpreende todo mundo. Ele não comparece a uma reunião do Conselho Deliberativo, mas manda uma cartinha, que é lida em voz alta por um aliado.

Nessa carta, Petraglia diz que está se retirando da diretoria com efeito imediato e escreve uma frase que soou como uma acusação: [abre aspas] não deixarei que usem ou desfrutem do nosso Athletico para benefícios pessoais.

A situação ficou tensa.

Lembra do Ênio Fornéa, o engenheiro que fazia parte do trio que assumiu o Athletico em 1995? Ele era discreto, raramente falava com a imprensa.

Mas, dessa vez, ele veio a público exigir que o Petraglia explicasse aquelas insinuações. Também falou que, antes mesmo da carta-renúncia, já estava definido que o Petraglia teria apoio para reassumir a presidência nas eleições marcadas para dali a três meses.

Alguns dias depois, Petraglia chama a imprensa para comer uma paella na sua nova mansão, no bairro Campo Comprido. 

Essa casa, aliás, é um de um luxo assombroso. De fora, parece um condomínio enorme, mas é só a mansão do Petraglia mesmo. Tem guarita, piscina, pista de caminhada e campo de futebol com iluminação e arquibancada.

Mas, enfim… Naquela paella com os jornalistas, em março de 2002, Petraglia coloca panos quentes na história da carta-renúncia e diz que a intenção não era acusar ninguém.

(Petraglia) Acho que já cumpri em seis anos a minha missão de ajudar a tirar o Athletico da segunda divisão, criar toda essa infraestrutura que foi criada, ganhar seletivas, participar da Libertadores… agora campeão brasileiro… ajudamos a dar esta estrela de ouro que ficará eternamente na nossa camisa… acho que tem que haver alternância e mudanças de mentalidades. Acho que está na hora de outros athleticanos virem colaborar e dar continuidade a este trabalho.

Àquela altura, Doático Santos já era um político conhecido em Curitiba. Tinha sido vereador no início dos anos 1990 e era presidente do PMDB local. Além disso, era uma figurinha carimbada na Boca Maldita – uma confraria de debates no Centro de Curitiba.

E, assim como a maioria da torcida athleticana em 2002, Doático era um petraglista de carteirinha. Afinal, o doutor Mario Celso era a cara da diretoria que tirou o clube da miséria e entregou um título brasileiro em apenas sete anos.

Então, Doático usou a influência que tinha para organizar um movimento pedindo a permanência do homem.

(Doático Santos) E foi aí que nós, então, imediatamente fizemos repercutir a notícia do da saída do Petraglia com a volta do Petraglia. Agora, vamos fazer o ‘Fica Petralglia’ e vamos juntar de plano mais de 100 mil athleticanos fazendo essa convocação para que ele volte.

Existem pessoas que contestam a espontaneidade do movimento “Fica Petraglia”, assim como duvidam da real intenção por trás da carta-renúncia.

Será que o Petraglia queria mesmo deixar o clube? Ou foi tudo uma jogada de marketing pessoal para assumir o Athletico ainda mais forte, aclamado pelo povo?

Bem, se a ideia era essa, deu certo. Depois da renúncia, Petraglia foi num jogo do Athletico como torcedor, no Couto Pereira, onde ele foi tietado como uma estrela. O movimento “Fica Petraglia” também foi um sucesso e juntou mais de 150 mil assinaturas em apenas duas semanas.

E no dia 4 de abril, exatamente um mês depois da “cartinha da discórdia”, já havia no Athletico um novo conselho, eleito antecipadamente, em chapa única, que aclamou o Petraglia como presidente.

Começava ali uma nova era, em que Mario Celso Petraglia comandaria o clube com mais poderes do que nunca, e acumulando rancor dos que passaram para a oposição.

(Petraglia) Essa caminhada difícil começou em 2002, quando renunciei, quando houve o movimento liderado, hoje, pelo nosso conselheiro Doático e outros amigos. “Fica, fica, fica”… eu fiquei. Vaidade, vontade de continuar a caminhada, sei lá… poderíamos dar mil explicações. De lá para cá, se reúnem em bares, em antros, em locais de baixo nível… bebendo, cheirando e conspirando contra a nossa honra. Já se vão quase 15 anos e eles não desistem.

A lua de mel de Petraglia com a torcida começa a desandar em 2004, que foi um ano agridoce para os athleticanos.

(Carolina Soares) O Athletico Paranaense entrou em campo não só para segurar a liderança do campeonato, mas também para dar show! Uma jogada rápida, o toque de primeira de Washington e o gol de Jadson. Depois um toque sutil para tirar Emerson da jogada. A troca de pé e o fundo da rede: o segundo gol de Jadson. O Galo não se encontrava em campo. Washington recebe de Alan Bahia e marca o terceiro do Furacão. Dagoberto não se intimida: pará-lo, só com falta. Mais um toque sutil de Jadson e a bola, outra vez, no fundo da rede. A defesa aberta facilitou a vida de Dênis Marques, que completou a goleada. Atlético Paranaense 5, Atlético Mineiro zero.

O Furacão de 2004 era isso aí. O time que revelou o ídolo Fernandinho (hoje de volta ao clube), além de craques como Jadson e Dagoberto.

A equipe comandada por Levir Culpi tinha ainda o centroavante Washington, recuperado de um problema cardíaco. Naquele Brasileirão, o “Coração Valente” bateu o recorde de maior artilheiro numa edição: 34 gols em 46 rodadas.

(Gil Rocha) Marcão, de novo, foi para o cruzamento… Washington! GOOOOOOL! Washington! Aqui na arena da Baixada, 1 para o Athletico, 1 também para o Botafogo…

Na reta final do torneio de pontos corridos, o Athletico estava na liderança e jogando o fino da bola. Então o ETA, torcida organizada do Doático, resolveu repetir a ideia de 2001: colocou em frente à Baixada um painel com a contagem regressiva para o bicampeonato.

Só que, dessa vez, não deu boa. Tanto que a única foto que eu achei desse painel foi num blog da torcida do Santos.

O que aconteceu nas últimas rodadas foi traumático para os athleticanos, porque o bi passou muito perto. O Furacão poderia ter disparado na liderança, mas aí aconteceu a tragédia de Erechim.

A vitória estava no papo: o Athletico vencia o Grêmio por 3×1 até os 45 do segundo tempo. Nos acréscimos, toma dois gols e cede o empate para o lanterna do campeonato, que foi rebaixado naquele mesmo dia 28 de novembro.

(Paulo Brito) Mais atrás com Marcelinho. Pintou cruzamento para o Cláudio Pitbull… Feito! GOOOOOOL! O Grêmio chega lá com Cláudio Pitbull, número 7…

A pá de cal na esperança do título de 2004 veio na penúltima rodada, quando o Furacão perde para o Vasco em São Januário por 1×0. O Santos assume a liderança e acaba levando o caneco.

Mas é aquele empate desastroso de Erechim que atormenta até hoje os athleticanos – e que foi motivo de muita polêmica.

Meses depois, numa entrevista coletiva, Petraglia diz que, logo antes do jogo contra o Grêmio, Levir Culpi exigiu a renovação antecipada do contrato, com aumento salarial. Segundo Petraglia, o clube não cedeu e o técnico fez corpo mole na sequência do campeonato.

O Levir rebateu essa história diversas vezes. Na versão dele, é absurdo alguém cogitar que um técnico entregaria um título brasileiro de propósito. E, numa nota divulgada à época, Levir Culpi fez uma das críticas mais duras que o Petraglia já recebeu até hoje:

[LEITURA DE DOCUMENTO]
Mário Celso Petraglia pensa que só a estrutura do Athletico Paranaense ganha jogos e campeonatos, e nós sabemos bem, dentro do futebol, que as pessoas que trabalham com seriedade e dedicação fazem a diferença. Algumas pessoas pensam que são deuses, o Petraglia tem certeza que é. Ele não tem amigos, só funcionários. As pessoas trabalham com ele e não por ele. Eu lamento tudo isso.

Mas Levir Culpi não foi o único a ser esculachado pelo Petraglia naquela coletiva, que foi um dos maiores episódios de fúria do doutor Mario Celso.

 

Como eu estava falando, a relação do Petraglia com as organizadas começou a azedar em 2004, por vários motivos: pancadarias que traziam punições ao clube; venda de materiais que concorriam com a fornecedora oficial; vaias e cobranças em fases ruins do time… mas o ponto central era preço de ingresso.

 

Em 2004, a diretoria resolveu dobrar o valor do ingresso: de 15 para 30 reais.

30 reais, atualizando pela inflação, é como se um ingresso custasse, hoje, 88 reais. Na época, era um valor que comprometia 12% do salário mínimo.

Só a título de comparação: um ingresso avulso na Baixada custa, em outubro de 2023, 200 reais – o que consome 15% do salário mínimo. Ou seja: o preço subiu (e subiu bastante).

 

(Petraglia) Nós precisamos faturar, gente. Sem dinheiro não se faz futebol. O futebol mudou. O jogador só tem uma coisa na cabeça: o contrato dele, quanto que ele vai levar para casa no final do mês.

 

Lá em 2004, a diretoria argumentava que o ingresso ficaria mais barato (apenas “dezão”) para quem comprasse o carnê do “Season Tickets”, que garantia entrada a todas as partidas na Arena. O clube estava importando dos Estados Unidos e da Europa um modelo que visava fidelizar torcedores e ter um faturamento estável com bilheteria – o embrião do sistema de sócio-torcedor.

 

Hoje, o plano mais barato no Athletico custa 105 reais por mês e garante entrada a todos os jogos na Baixada. Para quem pode assumir essa despesa mensal e frequentar todas as partidas, vale muito a pena (acaba saindo, às vezes, menos de 30 reais por jogo). Mas, é um modelo que praticamente excluiu do estádio quem não é sócio, por causa do preço proibitivo do ingresso avulso.

 

Na enquete deste episódio, no spotify e no Youtube, a gente quer saber a sua opinião sobre o preço do ingresso de futebol hoje.

 

Acontece que, lá em 2004, as organizadas não se conformaram com o ingresso a 30 reais. A Fanáticos e o ETA uniram esforços, protestaram e forçaram um acordo no Procon. O Athletico foi obrigado a criar ingressos populares por “vintão”, nas arquibancadas, atrás dos gols.

 

Em represália, o clube proibiu a entrada da bateria da Fanáticos em diversos jogos. Essa punição, com idas e vindas, durou até maio de 2005.

 

Além da tensão com a torcida, em maio de 2005, Petraglia estava em pé de guerra com a imprensa. Ele não dava entrevistas a veículos paranaenses havia meses, porque dizia que a imprensa local não apoiava o clube.k

 

Para piorar, a situação em campo não ajudava. O Athletico estava sem técnico, tinha perdido os três primeiros jogos do Brasileirão e tomado uma chinelada de 4×0 em casa do Independiente de Medellin, na Libertadores.

 

Eu usei a expressão “chinelada” porque foi a mesma que a Tribuna escolheu. “Atlético no chinelo”: essa foi a manchete que levou Petraglia a um dia de fúria.

 

Ele, que não dava entrevistas, convocou no dia 12 de maio de 2005 uma coletiva e distribuiu grosseria para todo lado: bateu boca com Remy Tissot e Carneiro Neto (dois veteranos da crônica esportiva), convocou um boicote à Tribuna, fez aquela acusação sobre o Levir Culpi e ainda descascou as organizadas de todas as formas possíveis.

 

Infelizmente, eu não consegui áudio dessa coletiva. Acho que foi porque ninguém fez questão de manter um registro de um episódio tão constrangedor para tanta gente. Ou, talvez, porque o noticiário esportivo estava mais focado no divórcio entre Ronaldo e Daniela Cicarelli.

 

(Repórter) Vocês estão vendo aqui imagens da Cicarelli chegando e, oh, atente aqui, olha, sem aliança… ela muito tensa… 
(Outra repórter) Você tem um novo amor, Daniela?

 

Depois daquela coletiva, a Fanáticos e o ETA se unem para lançar o movimento “Fora Petraglia”. Numa entrevista à época, Doático Santos afirmou: [abre aspas] Ele agrediu mais uma vez a torcida atleticana. Sua agressividade mostrou que não tem equilíbrio para manter-se à frente do clube.

 

Mas esse movimento durou pouco. Uma semana depois, é feito um acordo, com o objetivo de apoiar o time na Libertadores. No intervalo do jogo contra o Cerro Porteño, pelas oitavas-de-final, a bateria da Fanáticos é liberada e o Athletico vence por 2×1, numa das maiores festas que a Arena já viu.

 

Depois disso, o Furacão engrena uma sequência que levaria o time à final pela primeira vez, em mais um torneio com um desfecho agridoce para o torcedor rubro-negro.

 

  • (Mix de áudios da Transamérica TV e TV Globo com polêmicas e gols das finais da Libertadores 2005)

O curioso desse caso do “Fora Petraglia” é que, a rigor, o Petraglia nem era presidente do Athletico. Quer dizer, ele era presidente do Conselho Deliberativo, um órgão que tem mais de cem pessoas e pouquíssimas atribuições.

Em tese, quem gere o dia a dia do clube é o Conselho Administrativo, com o presidente e seus diretores de futebol, marketing, finanças, etc. De 2004 a 2008, o presidente da administração era o Fleury.

 

(João Augusto Fleury) Meu nome é João Augusto, mas só minha mãe e minha mulher é que me chamam assim. Na verdade, o sobrenome Fleury é muito forte na história do Paraná e do Brasil…

 

João Augusto Fleury da Rocha está no Athletico há décadas. Veio de Guarapuava (no interior do Paraná) e foi convencido a virar sócio em 1970, antes mesmo de ter ido pela primeira vez à Baixada. De lá para cá, participou de várias gestões, ajudando, principalmente, na área jurídica.

 

Fleury é advogado e procurador federal. É um cara muito polido e articulado. Mesmo conversando comigo à vontade num café, às vezes parecia que ele estava fazendo uma sustentação oral.

 

(João Augusto Fleury) O que o Mario Celso tem é um profundo respeito pelas pessoas, o que parece que não tem. As pessoas que o veem na mídia, parece uma pessoa autoritária, um indivíduo que adota seus princípios acima de quaisquer outros, que atropela os outros, que é um usurpador de funções… não é assim, o Mario é uma pessoa extremamente sensível. É que ninguém sabe da vida pessoal dele porque ele faz questão de ocultar. Ele é um indivíduo dócil…

 

Esse lado conciliador e diplomático do Fleury foi, muito provavelmente, o que permitiu uma dobradinha de quatro anos com o Petraglia.

 

O Fleury foi bastante atacado por causa do preço do ingresso, por campanhas ruins do time a partir de 2006 e por derrotas no clássico Athletiba. Eu lembro da torcida gritando “Fleury, canalha, fantoche o Petraglia”. 

Mas, ele se coloca de uma maneira muito tranquila em relação às decisões que foram tomadas e à forma como dividia tarefas com o Petraglia.

 

(João Augusto Fleury) Há duas maneiras da pessoa assumir funções dentro de um clube: ou ela faz por idealismo, está lá para ajudar, tipo assim, ‘estou aqui para ajudar para colaborar’, ou então está ali porque quer aparecer quer ter um destaque. Eu entrei justamente com a missão de contribuir, como eu estava fazendo já no Atlético há mais de 20 anos. E eu fui convidado pelo Mario Celso. Estabeleci com o Mario que nós poderíamos colaborar sim, dentre algumas atribuições que estavam ao meu alcance, e que outras ficariam com ele. Isso foi absolutamente transparente, foi exposto isso ao público, não era nenhum segredo…

 

No final de 2007, ainda na gestão Fleury, o Petraglia assume um novo projeto, bem específico.

 

(Joseph Blatter) The executive committee has decided unanimously to give the responsibility, not only the right, but the responsibility to organize Fifa’s World Cup 2014 to the country Brazil.

 

A Copa do Mundo é um evento que tem a cara do Petraglia. Mais do que futebol, ela envolve bilhões de dólares em obras, marketing, patrocínios, comissões… só alguém com um ótimo jogo de cintura político consegue navegar nesse mar globalizado e cheio de tubarões.

 

(Petraglia) Eu não sou político. Não tenho intenção de ser candidato a nada. Respeito os políticos, já fiz muita política na minha vida, a minha política pessoal hoje é a de fazer do meu clube um clube grande.

 

Petraglia vinha se preparando há anos para sediar uma Copa. A Arena vermelha, inaugurada em 1999, foi construída com base nas normas da Fifa, quando o Brasil já era cotado para virar sede. Só que a vinda da Copa demorou, e as exigências da Fifa foram atualizadas.

 

Mas, antes de pensar em reformar a Arena, Petraglia precisava garantir a Copa em Curitiba – o que não foi nada fácil. Teve uma enorme disputa política com o governador Roberto Requião e o vice dele, Orlando Pessuti. O estado chegou a indicar para a Fifa que queria jogos no Pinheirão (um estádio abandonado que era da Federação Paranaense).

 

(Petraglia) O estado do Paraná com todo respeito e carinho que eu tenho pelo governador Pessuti, absolutamente até agora não fez nada. Pelo contrário, atrapalhou! Dos 27 estados, o único estado que não foi visitado pelo presidente Ricardo Teixeira foi o nosso. Nós recebemos o caderno de encargos da Fifa por e-mail e ele disse que não viria aqui e não veio.

 

Depois de muita articulação e pressão, o governo do Paraná indicou a Arena da Baixada.

O famoso jeitinho brasileiro garantiu que a Copa fosse disputada em 12 cidades – algo que não faz sentido nenhum pensando na quantidade de jogos e no custo de cada sede, mas faz todo o sentido na lógica de usar o evento para fazer acenos políticos ao máximo de pessoas possível.

 

  • (Áudio de Joseph Blatter anunciando cidades escolhidas para sediar a Copa de 2014)

Com essa abundância de sedes, em maio de 2008, a Baixada entra oficialmente na rota do segundo maior evento esportivo do mundo, como o Petraglia sempre quis.

 

No final daquele ano, 2008, tem eleições no Athletico, e duas chapas se inscrevem (algo que não acontecia havia muito tempo). 

 

(Petraglia) Ótimo. Para nós… a democracia é fundamental.

 

Com 77% dos votos, venceu o grupo apoiado por Petraglia, com uma novidade: pela primeira vez desde 1995, o doutor Mario Celso não era candidato a nenhum cargo, em nenhum dos conselhos.

 

Petraglia queria ficar apenas como representante do clube em assuntos relacionados à Copa do Mundo. Então ele indica para a presidência um aliado de longa data. Um advogado que defendeu o Athletico no caso Ivens Mendes, que já tinha chefiado o departamento jurídico e o de futebol… uma pessoa que ele acreditava ser de confiança.

 

(Petraglia) Daí eu estava cansado, a Copa do Mundo só viria em 2014, já tínhamos conseguido que Curitiba fosse a sede, me dispus a ajudar a construir o estádio… estava cansado. Daí, não ia me envolver nas eleições. Eles me procuraram, ‘não, porque a oposição… você não pode… estamos com você há oito anos, você tem que nos ajudar…’. Eu apoiei. Me traíram no dia da posse (risos)
(Mauro Beting) Às vezes é no dia seguinte… foi mais rápido.
(Petraglia) Esse foi no mesmo dia.
(Benjamin Back) Mas o senhor não é de levar essas coisas pra casa, não.
(Petraglia) Mas eu não levei para casa. Eu infernizei a vida desses caras três anos.
(Benjamin Back) E já me falaram que não é bom ter o senhor como inimigo.
(Petraglia) Não… eu sou amigo dos meus amigos.

Quem assumiu o Athletico para o triênio 2009-2011 foi o advogado Marcos Malucelli – cuidado para não confundir com o advogado Marcus Coelho, presidente campeão brasileiro de 2001.

 

Petraglia comemorou muito a eleição de Malucelli (estourou champagne e tudo). Mas a parceria durou pouquíssimo, semanas.

Segundo o Petraglia, ele foi traído. Mas o que ele quer dizer isso?

 

Bem… em off, todo mundo diz a mesma coisa: Petraglia achou que continuaria mandando no clube mesmo fora da presidência (como fazia, em alguma medida, nas gestões anteriores). Mas, com Marcos Malucelli, isso não aconteceu.

 

(Malucelli) A Transamérica quer saber os motivos do rompimento meu com Mario Celso Petraglia. Então aí já vai sair historinha…

 

Esse é o próprio Marcos Malucelli, na sua última entrevista como presidente do Athletico, em dezembro de 2011. Foi uma coletiva de quase duas horas em que ele respondeu perguntas de toda a imprensa e desabafou sobre o ex-aliado.

 

(Malucelli) Em janeiro ele voltou, fizemos uma reunião logo no início, dia 5, dia 6, uma coisa assim, primeiro dia útil de de volta da do pessoal das férias… E nesse mesmo dia à noite, ele me telefonou dizendo que estava saindo… porque estava insatisfeito em função que nós tínhamos mandado uma funcionária embora. Era uma funcionária de pouca remuneração, um cargo de pouca importância, mas ele ficou bravo porque tinha sido colocada por ele. Aí as coisas começaram a se agravar. Mas, em seguida, ele me telefona e me pede cinco jogadores para levar para o Rio Branco do Acre. Me deu a relação de cinco jogadores. Então, eu neguei e ele ficou bravo. Aí sim foi definitivo. Ele ficou muito brabo e mandou um email para mim, naquele estilo dele, com adjetivos bonitos, próprios do vocabulário dele.

 

No primeiro ano da gestão Malucelli, em 2009, o Athletico foi campeão Paranaense, mas terminou o ano brigando para não cair – algo que já vinha acontecendo nos anos anteriores.

 

Em 2010, o Athletico perde o estadual para o Coxa, mas faz um bom Brasileiro. Acaba em 5º lugar e quase belisca uma vaga para a Libertadores.

 

(Julio Oliveira) Foi pro chão e a falta marcada. Pouca distância do Paulo Baier. Paulinho ali também próximo da bola. É o Paulo Baier quem foi pra cobrança… GOOOOOOOL. Paulo Baier. Falta, ali pra ele, é praticamente um pênalti.

 

É… mas o terceiro (e último) ano da gestão Malucelli foi um show de horrores. 

Em 2011, o time trocou de técnico cinco vezes: Sérgio Soares, Leandro Niehues, Geninho, Adílson Batista, Renato Gaúcho e Antônio Lopes.

 

A Diretoria não conseguiu um goleiro seguro para repor a venda do Neto para a Fiorentina. Depois, apostou na contratação por empréstimo de medalhões que não deram certo, como o lateral Edilson, o atacante Madson “o foda”, os meias Cléber Santana e Marcelo Oliveira. No ataque, os gringos Guerrón e Nieto não deslancharam, mesmo servidos por Paulo Baier.

 

E teve ainda uma outra contratação polêmica, muito cara, que foi um fiasco total. Sobre esse jogador, a gente fala daqui a pouco.

 

(Apresentador) Agora, presidente, face a esta situação, torna-se urgente que o Athletico se empenhe, como prioridade, em manter-se na Série A.
(Malucelli) Não tenha dúvida: que nós vamos nos manter na Séria A, nós vamos. Não tenha dúvida!

 

Como o próprio Petraglia diz, ele virou oposição e infernizou a situação. Aproveitou cada vacilo para atacar, de tudo que é jeito.

Com o time na zona de rebaixamento em 2011 e eleições previstas para o final do ano, Petraglia emergiu como favorito para reassumir a presidência.

 

(Petraglia) Gente, eu vou confessar para vocês. Eu sou um emocional. Eu já resolvi: eu vou ser candidato. Se for agora antecipada as eleições eu serei, se em dezembro, também serei. Se eu tiver, como estou sentindo, o apoio que eu recebo de Facebooks, de Twitters, de e-mails, de ruas, de restaurantes aonde eu vou, vai ser um massacre.

 

Quando o Petraglia lançou a pré-candidatura numa coletiva, ele explorou o péssimo desempenho da Gestão Malucelli nos Athletibas: eram 5 derrotas, 4 empates e nenhuma vitória em dois anos e meio.

 

(Petraglia) Isso que me leva a pensar a voltar. Isso que me levou… também o pedido dos meus netinhos: ‘Vovô, eu não aguento mais perder para o Coritiba, vovô!”. Isso me leva, me machuca, me dói…

 

Para colocar fogo de vez na campanha, entra em campo, novamente, o senhor Doático Santos. Ele, que foi a cabeça do “Fica Petraglia” em 2002 e do “Fora Petraglia” em 2005, agora coordenava o movimento “Volta Petraglia” e a chapa “CapGigante”.

 

Já em clima de campanha, o doutor Mario Celso chega apelando. Primeiro, lança aquela famosa promessa de ser campeão mundial em dez anos. Depois, aplica um golpe duríssimo: divulga os salários do elenco de 2011.

 

Segundo a planilha no Facebook do Petraglia, jovens promovidos da base, como Renan Foguinho, recebiam 7 mil reais, enquanto alguns medalhões recebiam mais de 200 mil. Ele atribuía à gestão Malucelli essa discrepância e dizia ser impossível gerir um elenco dessa forma.

 

É… mas a divulgação dos salários pegou mal até entre petraglistas. O time estava brigando para não cair e o vestiário não precisava de mais lenha na fogueira.

 

(Malucelli) Atrapalhou fora. Porque você ter uma pessoa diuturnamente, diuturnamente te criticando, agredindo verbalizando… é complicado, é ruim. Isso desestabiliza, atrapalha. Era o que ele queria. Isso é uma estratégia nazista, né? Você atacar para desestabilizar o outro. Aí ele sabe usar bem isso, ele é craque nisso.

 

Se o episódio da divulgação dos salários foi decisivo ou não, é impossível saber. Mas faz parte do folclore do rebaixamento de 2011, que foi inevitável.

 

  • Mix de áudios da torcida do Athletico gritando “Fora, Malucelli”

A troca de agressões entre Petraglia e Malucelli não ficou só por conta do desempenho do time em campo.

 

Um ponto de divergência era a reforma para a Copa do Mundo.

Malucelli defendia terminar o 2º anel do projeto original da Arena e, se necessário, entregar a obra para uma empreiteira. Ele até ironizava a proposta do Petraglia, que era o Athletico assumir a obra sem parceiros, reconstruir a maior parte do estádio e ainda instalar um teto retrátil.

 

(Malucelli) …que vai cobrir o estádio. Como se isso custasse 30, 40, 50 milhões de reais. Isso custa três, quatro vezes mais. Nós não temos dinheiro nem para terminar o estádio, como é que vamos cobrir estádio? Mas são promessas eleitoreiras, e tem pessoas que acreditam. Se fosse assim, o Tiririca não tinha sido eleito…

 

A reforma da Arena para a Copa daria uma temporada inteira de podcast. Mas o fato é que a Baixada tem hoje o único teto retrátil do Brasil e a obra foi feita pelo próprio Athletico, como o Petraglia queria.

 

(Petraglia) Não há fracasso, há só sucesso. O fracasso, os senhores querem imputar onde não existe. Foi o melhor e o maior sucesso de construção de um estádio no Brasil. O mais bonito, o mais barato, o próprio. Aliás, estes benefícios que o Athletico Paranaense está obtendo e obteve, os senhores queriam entregar para a OAS. E, hoje, a OAS estaria se beneficiando do tripartite e ainda ficaria com 25 anos de todas as receitas do estádio.

 

É verdade também que, até a gravação deste episódio, o Athletico estava perto, mas ainda não tinha resolvido 100% o problema da dívida da Baixada, repartida com o município e o estado. Essa briga judicial é um asterisco, uma nota de rodapé que continua pendente no balanço financeiro do clube.

 

A treta entre Petraglia e Malucelli respingou também na família dos dois.

Petraglia acusava o adversário de envolver o irmão e o filho em negócios do clube. E Malucelli retrucava.

 

(Malucelli) Agora, ele joga isso. Malandro. Porque é da índole dele, da má fé que ele tem. Mas eu desafio o seu Mário Celso Petraglia a trazer um documento, um, que tem envolvimento do meu irmão em qualquer transação do Athletico nos meus três anos de clube.

 

Só para reforçar, esse é o Marcos Malucelli, na última coletiva do mandato dele, lavando toda a roupa suja, divulgando e-mails e exibindo documentos.

 

(Malucelli) …e ele, senhor Mario Celso Petraglia, tem a coragem de dizer que meu filho leva vantagem dentro do Athletico. Esquece que o filho dele, que é um bom rapaz, ficou com nossos espaços de publicidade que vendeu para a Timemania e ganhava dinheiro em cima disso. Esquece que o filho dele vendeu cadeiras aqui para nós. São boas as cadeiras? São boas. Mas nós não fizemos licitação para ver se teriam outras mais baratas. 
Esse mesmo ex-dirigente tinha, até eu entrar aqui, a esposa, que prestava consultas psicológicas aos nossos jogadores da base. Nada de mais. Mas não houve licitação nenhuma. O genro fez a obra da Arena e, possivelmente, a Arena da Floresta, etc.
O primo do ex-presidente é o responsável pelo projeto arquitetônico da obra, que custa alguns milhões de reais. Não houve licitação para sabermos se a proposta dele era a melhor e a mais barata.

 

Nesse dia aí, o Petraglia foi acusado até de beneficiar um affair (uma namoradinha) dentro do clube.

 

(Malucelli) Não bastasse o filho, a mulher, o genro, o primo, a outra filha que ficou explorando a academia da Arena por um bom tempo, sem renda para o Athletico… ainda tem, veio à tona, porque a própria pessoa envolvida noticiou no seu blog, uma relação de maior intimidade com a própria funcionária do clube. E essa funcionária é uma funcionária bem remunerada, que tinha direitos que outros não tiveram aqui dentro.

 

Essa chuva de acusações rendeu alguns processos que, até onde eu saiba, não deram em nada.

 

Lembrando que, quem apoia o documentário com pelo menos 70 reais vai receber um episódio exclusivo em que a gente revela curiosidades de processos em que o Petraglia enfrentou jornalistas, juízes de futebol e torcedores.

 

Para colaborar com qualquer valor, é só acessar a nossa campanha de financiamento coletivo no site apoia.se/senhordarazao ou fazer um pix para o e-mail contato@senhordarazao.com.br. 

 

Mas, a briga mais emblemática entre Petraglia e Malucelli aconteceu por causa de um jogador.

 

(Julio Oliveira) …tem até espaço para o cruzamento, tentou o levantamento para o meio, olha o Morro! GOOOOOL! Morro Garcia de novo!

 

Esse gol narrado pelo Julio Oliveira, do SporTV, foi o segundo de Santiago “El Morro” Garcia contra o Botafogo, em 2011. Os dois gols marcados nessa noite foram os únicos do centroavante com a camisa do Athletico em 18 jogos.

 

Morro Garcia era para ser a bala-de-prata da gestão Malucelli para salvar o time do rebaixamento. A diretoria pagou mais de 7 milhões de reais na época pela promessa uruguaia de 20 anos.

 

(Nadja Mauad) Santiago, você é a contratação mais cara do futebol paranaense e chega num momento que o Athletico precisa muito de um jogador de qualidade para dar essa alavancada no campeonato Brasileiro, o time está numa situação complicada.
(Morro Garcia) Yo llego con la total certeza de hacer un buen trabajo, tratar de ayudar en lo que más pueda al equipo…

 

Pouco depois de ser apresentado em Curitiba, Morro Garcia foi punido lá no Uruguai por doping de cocaína.

A chapa do Petraglia, que estava na oposição, exigiu que o Athletico devolvesse o atacante e pegasse o dinheiro de volta. Mas a diretoria, comandada por Marcos Malucelli, não fez isso, alegando que a punição não valia no Brasil e que o time precisava do jogador.

 

No final de 2011, com o Athletico já rebaixado, a chapa “CapGigante” não teve dificuldade em vencer as eleições. Petraglia recebeu ⅔ dos votos e teve apoio, inclusive, da Fanáticos – o que não deixa de ser curioso, considerando o histórico de ofensas mútuas entre eles.

 

(Petraglia) Nós temos uma. Qual é o clube que tem uma única torcida organizada? Acabamos com todas elas. Uma sobrevive. Ainda. E, se possível, vamos trabalhar para que desapareça, porque isso não trás absolutamente nada de positivo.

 

Conforme prometido na campanha, Petraglia conseguiu devolver Morro Garcia ao Nacional do Uruguai, desfazendo o negócio.

 

O Athletico ainda processou Marcos Malucelli na Justiça comum, onde ele foi absolvido em duas instâncias. Mas o Conselho de Ética do clube, subordinado ao Petraglia, julgou que Malucelli foi culpado por danos ao Athletico e excluiu o ex-presidente do quadro de sócios do qual ele fazia parte desde 1963.

 

Quando parecia que a história de Santiago “El Morro” Garcia estava no passado, ela voltou da pior forma possível. Em fevereiro de 2021, o atacante, com apenas 30 anos, foi encontrado morto em casa. Ele enfrentava um quadro grave de depressão e o caso foi tratado como suicídio.

 

(Sebastián Bignolo) Yo me puse a pensar en la historia del jugador de fútbol, y sobre todo, en Santiago Garcia, El Morro Garcia. Dije: qué difícil debe ser dejar de ser. Que difícil debe ser, insisto, sentirte olvidado, sentirte depreciado, sentirte desprestigiado, sentirte devaluado cuando apenas tienes 30 años.

 

Era um momento de luto. O Athletico emitiu uma nota de pesar, como fizeram diversos clubes e profissionais do mundo inteiro.

Mas o Petraglia achou uma boa ideia, na ocasião, usar o Twitter pessoal para exaltar o próprio empenho na devolução do Morro García para o Uruguai, e aproveitou para atacar novamente os dirigentes que contrataram o atacante lá em 2011.

Um episódio de falta de sensibilidade que surpreendeu até quem está se acostumando com o jeitão do homem.

 

Depois de ser repreendido por centenas de torcedores, Petraglia apagou a publicação e pediu desculpas.

 

O que aconteceu depois do rebaixamento de 2011 e da volta do Petraglia à presidência, eu deixo para ele mesmo resumir.

 

(Petraglia) Nós subimos em 12, fomos 3º do Brasil em 13, fomos e finalistas da Copa do Brasil, fomos 8º em 14, 10º em 15, ainda construindo um estádio, jogando fora da nossa casa. Isso é competência, gente. Isso é fazer futebol e patrimônio ao mesmo tempo. E vamos continuar. Agora será muito mais fácil.

 

Em 2015, acontece um novo bate-chapa – e essa foi a eleição mais apertada e polêmica da história do clube.

Mais uma vez, Petraglia usou os serviços de Doático Santos para movimentar a chapa “CapGigante”.

 

  • Jingle da chapa CapGigante em 2015

 

Foi uma campanha enorme para os padrões de uma eleição de futebol. Teve jingle, carro de som, vídeos produzidos com ex-jogadores e até debate nos jornais.

 

(Petraglia) Aí quando eu vi essa gente voltando, depois, as mais recentes, aquelas que nos jogaram para segunda divisão, eu não posso me calar novamente. Entramos de cabeça na campanha porque o baixo nível está imperando.

 

De fato, rolou muita baixaria em 2015. A chapa de oposição, liderada pelo advogado Henrique Gaede, acusou Petraglia de usar dinheiro do clube na campanha e de dificultar o acesso à lista de eleitores. Dizem até que Petraglia mandou buscar sócios em casa, de carro, para que eles votassem na CapGigante.

 

Foi nessa eleição que a chapa do Petraglia usou uma foto de Henrique Gaede vestindo uma camisa de jogo e tomando cerveja na longneck, como forma de desabonar o candidato de oposição, lembra? Segundo o Gaede, essa foi mais uma das artimanhas de Doático Santos, que mantinha blogs para atacar a concorrência.

 

No fim, todas as ferramentas usadas por Petraglia valeram a pena (pra ele). A CapGigante venceu por uma margem apertadíssima: 52% dos votos, uma diferença de apenas 249 eleitores.

 

Mas essa foi a última vez que o doutor Mario Celso precisou enfrentar uma oposição. A partir de 2015, Petraglia deu início ao que ele chama de “fase do protagonismo”.

 

O Athletico tinha sua arena pronta, as finanças estavam em dia, as categorias de base estavam com estrutura de ponta… era chegada a hora de aumentar os investimentos no futebol. E, aos poucos, os resultados foram aparecendo.

 

  • Áudios de narrações de jogos e títulos do Athletico.

 

Nos últimos sete anos, o Athletico disputou cinco Copas Libertadores, sendo vice-campeão em 2022.

Nos dois anos que não jogou a Libertadores (2018 e 2021), foi campeão da Sulamericana.

Também ganhou a Copa do Brasil em 2019 e foi vice-campeão em 2021.

 

  • Hino do Athletico Paranaense

 

O prometido título mundial em dez anos não veio. Mas, com tantos bons resultados, quem é o athleticano que cobrar isso do homem?

 

(Petraglia) Ninguém fez por um clube de futebol, sendo um pouco cabotino agora, do que Mario Celso Petraglia fez por esse clube. Não no Brasil, gente, no mundo! As pessoas fazem por interesses pessoais, quando são donos do clube, que nem o seu Abramovich é dono do Chelsea. Ele faz!

 

Em fevereiro do ano que vem, 2024, Mario Celso Petraglia completa 80 anos. Em março, o Athletico completa cem.

 

Esse documentário é, de alguma forma, uma singela homenagem aos dois. Não uma homenagem-exaltação, uma peça de marketing… é uma homenagem que eu produzi entregando o melhor trabalho jornalístico que eu tinha condição de fazer.

 

Acho que isso é algo que eu aprendi com o Petraglia: é só com muito trabalho e obstinação que a gente consegue realizar grandes feitos. E este podcast, publicado de forma independente, é uma enorme realização pra mim.

 

Muito obrigado aos apoiadores que ajudaram a levar esse projeto até o final. Agradeço aos três athleticanos mais importantes da minha vida (minha mãe, minha esposa e meu filho), e à turma dos Amigos do Furacão. 

Obrigado às pessoas que me ajudaram com diversos trabalhos nesta produção e que receberam, quando muito, uma menção nos créditos do final de cada episódio.

Deixo um agradecimento especial ainda à imprensa esportiva e às fontes que dividiram essa história comigo.

 

Por fim, muito obrigado ao senhor, doutor Mario Celso Petraglia. Por favor, não leve nada para o pessoal. É a sua história que inspirou isso tudo. Vida longa.

 

(Petraglia) Eu sou movido a desafios, entende? Quando mais dificuldade, mais me dá força, ânimo, motivação para trabalhar.

 

(Petraglia) Quem vive de passado é museu, né? Então, o que vale é aqui e agora. Hoje, hoje. O resto é piada.

 

Por ora, este documentário está encerrado.

 

Vai virar livro? Vai virar série para streaming? Tem segunda temporada? Olha, tudo é possível, mas isso depende de fatores incertos.

 

Quando o projeto saiu, a gente se comprometeu a lançar cinco episódios. No final, foram sete, além dos três exclusivos para apoiadores.

Mesmo assim, a gente pode voltar a qualquer momento com mais algum episódio, dependendo das circunstâncias.

 

Nossa campanha de financiamento coletivo fica no ar até maio de 2024. Quem contribuir até lá vai continuar recebendo o link para os materiais exclusivos e o contato da produção. É só ir no site apoia.se/senhordarazao ou fazer um pix para o email contato@senhordarazao.com.br.

É nesse mesmo email, também, que você pode falar com a gente por qualquer outro motivo.

 

Além disso, se você tiver interesse em produzir um podcast, entre em contato. A gente está com um projeto de contar novas histórias neste mesmo formato, e vai ser um prazer ouvir a sua ideia.

 

Eu sou Filipe Andretta e este foi o 7º episódio do “Senhor da Razão?”, um documentário independente e não autorizado sobre Mario Celso Petraglia e o Athletico Paranaense.

 

Esse documentário tem pesquisa, produção, entrevistas, locução, roteiro e edição sonora de Filipe Andretta.

 

As locuções foram gravadas com o apoio da Arnica Cultural, em Curitiba.

Algumas leituras de documentos são feitas pela Andreia Porto, que não torce para ninguém.

A revisão é da athleticana Clara Vicente.

A vinheta e as trilhas sonoras são do palmeirense Vinícius Antunes, com áudios da soundstripe e da artlist.

O site e a identidade visual são do flamenguista Fabricio Vinhas.

A gestão das redes sociais tem o apoio de Lucas Daniel de Lima, que também não torce para time nenhum.

E a assistência de produção é do athleticano André Carneiro.

Além de entrevistas exclusivas, esse episódio usou áudios de:

 

  • Campanha eleitoral do PMDB
  • RPC
  • TV CAP
  • TV Record
  • TV Globo
  • SporTV
  • TV Mercosul
  • Fox Sports
  • SBT
  • TV Transamérica
  • Fifa TV
  • TV Band
  • E-Paraná
  • Conmebol TV
  • ESPN Brasil
  • Canal da chapa CapGigante
  • Gazeta do Povo
  • Rádio Band
  • ESPN Argentina

 

Obrigado e até a próxima.

 

(Petraglia) Esses pulhas…

 

Transcrição

Acesse a transcrição completa do episódio em arquivo PDF.